foto: Bruno Espadana

31 outubro 2008

#  Post-scriptum (1) ao post «Ignorância matemática»

Quem, na sequência da leitura do meu post anterior, se der ao trabalho de analisar o despacho ministerial que estabelece a fórmula de cálculo da classificação final de uma disciplina do Ensino Básico, poderá acusar-me de ignorância pedagógica, de (suprema ironia) ignorância matemática e/ou de má-fé.

Comecemos pela suposta ignorância pedagógica, deixando as restantes acusações para mais tarde.

Um erro que me pode ser apontado é o de falar da média de testes como se esta equivalesse à classificação de frequência obtida no final do ano lectivo. Admito que tal não é o caso: ao longo do tempo, o Ministério da Educação (ME), sob o auspícios de “cientistas” da Educação, foi agregando mais e mais critérios de avaliação (muitos deles inerentemente imensuráveis, ou convenientemente expressos de forma a serem de difícil mensuração), de forma que, de facto (e em certa medida, correctamente), as classificações obtidas nas avaliações formais periódicas escritas (vulgo, testes) não são o único factor a ter em conta no final do ano lectivo.

Mas sejamos honestos: em primeiro lugar, quando falei em médias percentuais não me limitei necessariamente aos testes escritos (o desempenho nos diferentes eixos de avaliação pode ser classificado na escala 0–100%, entrando cada um em linha de conta na classificação de frequência, com um peso relativo estabelecido a priori pelo professor, pela escola ou pelo Ministério); em segundo lugar, por muita importância que tenha a participação nas aulas, o comportamento, os «afectos» ou a misteriosa «relação do corpo com o espaço» — por muita importância que tudo isto tenha (e uns têm-na mais do que outros), o ponto de partida e o de maior peso para a determinação da classificação de frequência deverá ser sempre a prova factual dada por cada aluno de que adquiriu conhecimentos e competências, e essa prova é primordialmente apresentada nos testes escritos realizados ao longo do ano. Tudo o resto deverá servir apenas para pequenos ajustes na classificação final e, quanto a mim, primordialmente no sentido descendente: o mau comportamento poderá determinar a atribuição de um nível 4 a um aluno cuja capacidade intelectual comprovada ditaria um nível 5, mas rejeito que um comportamento angelical deva transformar em aluno de 5 um aluno que de facto demonstrou saber apenas o suficiente para alcançar o nível 4, ou em aluno de 3 aquele que mostrou não saber o suficiente para ser aprovado.
Isto poderá soar a alguns como uma injustiça, mas deriva de um princípio ético claro: o bom comportamento deverá ser a regra da convivência em sociedade, pelo que o cumprimento deste «requisito mínimo» não deverá ser algo de tão extraordinário que mereça recompensa de maior.

(Já agora, é, entre outras razões, por achar que deve ser mínimo o desvio da classificação de frequência face à média das avaliações formais periódicas que defendo a extinção, pelo menos a partir do 2.º Ciclo do Ensino Básico, da escala qualitativa de 1 a 5, pois com este sistema de classificação qualquer ajuste de nível é tudo menos mínimo. A escala de 0 a 20 é bem mais justa, não padecendo da excessiva — e enganadora — precisão que uma escala de 0 a 100% tem, rigor que poderá existir na classificação de uma prova em concreto, mas nunca na avaliação global de um desempenho.)

Esta discussão continua aqui.

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29 outubro 2008

#  Ignorância matemática

No Público online:

Quase todas as escolas do básico tiveram média positiva nas provas nacionais

Foram mais de mil as escolas que este ano tiveram uma média no exame nacional de Matemática do 9.º ano igual ou superior a 2,5 valores (numa escala de 1 a 5). Em 2007, tinham sido apenas duas centenas. Esta é uma das principais conclusões das notas de exame por escola ontem divulgadas pelo Ministério da Educação.

Quem faz (e quem noticia) médias de níveis 1 a 5 atribuídos no Ensino Básico mostra a sua ignorância matemática.

Os níveis (e não «valores», como erradamente os designam) 1 a 5 correspondem a uma escala qualitativa, não a uma escala quantitativa, pelo que não se pode com propriedade estabelecer uma média dessas classificações.
Note-se que a escala é de 1 a 5 — o que dá uma falsa ideia de quantitatividade —, mas poderia ser A, B, C... (como a escala de eficiência energética dos electrodomésticos), ou Vermelho, Laranja, Amarelo... (como os níveis de segurança ou a prioridade de atendimento hospitalar...). A opção por níveis numerados foi puramente arbitrária.

Há várias indicações de que a escala de 1 a 5 não é quantitativa, mas qualitativa:
  1. a ausência de um referencial absoluto (nível 0);
  2. a correspondência não-linear e arbitrária entre a classificação na escala 0-100% (esta sim, quantitativa) e os níveis de 1 a 5: tipicamente, 1 vai de 0 a 19%; 2, de 20 a 49%; 3, de 50 a 69% (ou a 74%); 4, de 70% (ou 75%) a 89%; e 5, de 90% a 100%;
  3. o facto de, por determinação ministerial, um nível 3 na avaliação de frequência (correspondente, digamos, a uma média de 50%) e um nível 2 no exame final (correspondente, p. ex., a uma classificação de 20% nesse exame) corresponder a um nível final de 3 (resultante do arredondamento da “média” de 2,7), independentemente das percentagens efectivamente obtidas (no exemplo dado, fazendo a média das percentagens obteríamos 41%, correspondente a um nível 2);
  4. uma turma com 10 alunos com testes de nível 4 e 10 alunos com testes de nível 2 não resulta necessariamente numa “média” de nível 3 de todos os testes da turma: por exemplo, se os níveis 4 corresponderem a uma média de 75% e os níveis 2 resultarem de uma média de 20%, a média da turma é 47,5%, o que corresponde a um nível 2.

Por isso, quando tratarem de classificações na escala (qualitativa) de níveis 1 a 5, não façam médias, que não são legítimas neste caso: façam medianas e outros percentis reveladores.

Ou, o que seria mais correcto (científica e pedagogicamente — ao arrepio do que defendem muitos “pedagogos”), abandonemos de todo a escala qualitativa de níveis 1 a 5 e fiquemo-nos pela muito mais natural, informativa e justa escala quantitativa de percentagens.
O único aspecto “negativo” dessa medida seria a impossibilidade de o Ministério da Educação decretar a “ginástica” criadora de (pseudo-)sucesso exemplificada no ponto 3 da lista anterior...

Ah, pois... Essa é uma enorme desvantagem política...


Nota: Este post tem um post-scriptum.

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15 outubro 2008

#  McCain, o reciclador

Num partido pouco amigo dos ambientalistas, o irreverente John McCain recicla o seu discurso velho e apresenta-o como novinho em folha:

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