foto: Bruno Espadana

29 outubro 2008

#  Ignorância matemática

No Público online:

Quase todas as escolas do básico tiveram média positiva nas provas nacionais

Foram mais de mil as escolas que este ano tiveram uma média no exame nacional de Matemática do 9.º ano igual ou superior a 2,5 valores (numa escala de 1 a 5). Em 2007, tinham sido apenas duas centenas. Esta é uma das principais conclusões das notas de exame por escola ontem divulgadas pelo Ministério da Educação.

Quem faz (e quem noticia) médias de níveis 1 a 5 atribuídos no Ensino Básico mostra a sua ignorância matemática.

Os níveis (e não «valores», como erradamente os designam) 1 a 5 correspondem a uma escala qualitativa, não a uma escala quantitativa, pelo que não se pode com propriedade estabelecer uma média dessas classificações.
Note-se que a escala é de 1 a 5 — o que dá uma falsa ideia de quantitatividade —, mas poderia ser A, B, C... (como a escala de eficiência energética dos electrodomésticos), ou Vermelho, Laranja, Amarelo... (como os níveis de segurança ou a prioridade de atendimento hospitalar...). A opção por níveis numerados foi puramente arbitrária.

Há várias indicações de que a escala de 1 a 5 não é quantitativa, mas qualitativa:
  1. a ausência de um referencial absoluto (nível 0);
  2. a correspondência não-linear e arbitrária entre a classificação na escala 0-100% (esta sim, quantitativa) e os níveis de 1 a 5: tipicamente, 1 vai de 0 a 19%; 2, de 20 a 49%; 3, de 50 a 69% (ou a 74%); 4, de 70% (ou 75%) a 89%; e 5, de 90% a 100%;
  3. o facto de, por determinação ministerial, um nível 3 na avaliação de frequência (correspondente, digamos, a uma média de 50%) e um nível 2 no exame final (correspondente, p. ex., a uma classificação de 20% nesse exame) corresponder a um nível final de 3 (resultante do arredondamento da “média” de 2,7), independentemente das percentagens efectivamente obtidas (no exemplo dado, fazendo a média das percentagens obteríamos 41%, correspondente a um nível 2);
  4. uma turma com 10 alunos com testes de nível 4 e 10 alunos com testes de nível 2 não resulta necessariamente numa “média” de nível 3 de todos os testes da turma: por exemplo, se os níveis 4 corresponderem a uma média de 75% e os níveis 2 resultarem de uma média de 20%, a média da turma é 47,5%, o que corresponde a um nível 2.

Por isso, quando tratarem de classificações na escala (qualitativa) de níveis 1 a 5, não façam médias, que não são legítimas neste caso: façam medianas e outros percentis reveladores.

Ou, o que seria mais correcto (científica e pedagogicamente — ao arrepio do que defendem muitos “pedagogos”), abandonemos de todo a escala qualitativa de níveis 1 a 5 e fiquemo-nos pela muito mais natural, informativa e justa escala quantitativa de percentagens.
O único aspecto “negativo” dessa medida seria a impossibilidade de o Ministério da Educação decretar a “ginástica” criadora de (pseudo-)sucesso exemplificada no ponto 3 da lista anterior...

Ah, pois... Essa é uma enorme desvantagem política...


Nota: Este post tem um post-scriptum.

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