# Coisas que valeu a pena ler hoje
O texto, de Helena Matos, é do Público de ontem, mas eu só o li hoje:
Uma amiga minha que é professora do Ensino Secundário já por várias vezes verificou a existência de um cenário similar entre a classe média, mais concretamente entre os mesmíssimos professores seus colegas.
Na escola onde trabalham, defendem com paixão os princípios «modernos» (ou «pós-modernos»?) da «escola inclusiva» virada primordialmente para o desenvolvimento dos «afectos» (e não para a instrução), paraíso da «pedagogia não directiva» (entenda-se: em vez da sistematização do conhecimento, deixem-se os putos à deriva...) — mas na escola onde os filhos andam, defendem com unhas e dentes a aplicação do método tradicional, com muito trabalho, muita exigência e muito rigor: a única via para o sucesso que efectivamente reconhecem (porque a única que disso deu provas). E quando o azar dita que uma e outra escolas sejam a mesma (no interior escasseiam as boas escolas privadas — escasseiam as escolas, ponto final), então não hesitam em contratar um explicador, para que colmate com mais trabalho, mais exigência e mais rigor (mais sistematização do conhecimento) as lacunas que, na sala dos professores, negam existirem... A minha colega sabe-o bem, pois não raro é ela a explicadora que contratam para aplicar à prole os métodos que publicamente, entre os seus pares, proscrevem como antiquados.
Os pobres são menos inteligentes do que os ricos?
«Em que escola estavas quando foi o 25 de Abril? Em que escola estão os teus filhos?» — À célebre pergunta «Onde é que estavas no 25 de Abril?» é imperioso que se juntem agora estas duas interrogações. Experimente-se por exemplo fazer estas perguntas aos ministros, deputados, autarcas, assessores, artistas, professores... e descobrir-se-á que a maior parte deles frequentou o ensino público mas optou pelo ensino privado na hora de inscrever os seus filhos e netos na escola. Não porque os seus filhos sejam mais ou menos inteligentes mas simplesmente porque têm medo que a falta de exigência os embruteça.
Duvido que algum destes hipotéticos inquiridos o assumisse claramente. Dariam como justificação os horários, os amigos, às vezes até os piolhos mas o que dificilmente diriam é que o fazem porque não acreditam na qualidade do ensino público. Muitos provavelmente serão oficialmente a favor do novo Estatuto do Aluno, tal como foram da afectação de tempos lectivos a ‘coisas’ como a Área de Projecto ou da desautorização dos professores e funcionários. Na prática isso não os afecta porque os seus filhos e os seus netos estão a salvo destes desmandos.
O falhanço do ensino público em Portugal tornou-se uma ratoeira contra os mais pobres: pobreza e o insucesso escolar tornaram-se sinónimos. E assim continuaremos para que ninguém preste contas por aquilo que começou por ser um erro e se está a transformar num crime.
Ao contrário do que se tornou quase banal dizer não foi a massificação do ensino público que comprometeu a sua qualidade. Os responsáveis por aquilo que os rankings cruamente espelham foram aqueles que fizeram da escola pública um espaço experiências sociológicas. Passamos a vida a discutir os programas mas um mau programa ainda é um programa. O pior foi baixar em cada ano lectivo o nível da exigência. Primeiro porque era mais moderno. Depois porque assim não se faziam distinções entre mais e menos inteligentes. Depois porque o objectivo da escola não era ensinar conteúdos mas sim ensinar a relacionar-se. Depois porque já não podia ser doutro modo.
Os filhos dos pobres não são nem mais nem menos inteligentes que os filhos dos ricos. Tiveram sim foi o azar dos seus pais não ganharem o suficiente para os poupar a esse papel de cobaias de teorias que tanto vêem na ignorância o estado supremo da perfeição igualitária como entendem que aprender tem de ser divertido e fácil. Nada disto afecta quem legisla porque os seus filhos não estão nas escolas públicas ou quando estão souberam contornar o crivo das moradas e horários de modo a frequentarem as turmas ditas dos filhos dos professores. Quem não pode fugir das más escolas é quem não tem dinheiro nem conhecimentos.
Alguns como Francisco Louçã querem agora diabolizar os rankings vislumbrando apoios da extrema-direita aos colégios que se encontram nos primeiros lugares. Engana-se redondamente. Quem fez a fortuna recente das escolas de maristas, jesuítas e da Opus Dei, dos colégios franceses, ingleses e modernos sem esquecer as escolas alemãs e americanas foram precisamente aqueles — às vezes de esquerda mas nem sempre — que resolveram que a escola pública não era o local onde todos tinham igual oportunidade de aprender, mas sim o espaço onde a irrelevância medíocre dos resultados provaria que todos podemos ser igualmente ignorantes e irresponsáveis.
Uma amiga minha que é professora do Ensino Secundário já por várias vezes verificou a existência de um cenário similar entre a classe média, mais concretamente entre os mesmíssimos professores seus colegas.
Na escola onde trabalham, defendem com paixão os princípios «modernos» (ou «pós-modernos»?) da «escola inclusiva» virada primordialmente para o desenvolvimento dos «afectos» (e não para a instrução), paraíso da «pedagogia não directiva» (entenda-se: em vez da sistematização do conhecimento, deixem-se os putos à deriva...) — mas na escola onde os filhos andam, defendem com unhas e dentes a aplicação do método tradicional, com muito trabalho, muita exigência e muito rigor: a única via para o sucesso que efectivamente reconhecem (porque a única que disso deu provas). E quando o azar dita que uma e outra escolas sejam a mesma (no interior escasseiam as boas escolas privadas — escasseiam as escolas, ponto final), então não hesitam em contratar um explicador, para que colmate com mais trabalho, mais exigência e mais rigor (mais sistematização do conhecimento) as lacunas que, na sala dos professores, negam existirem... A minha colega sabe-o bem, pois não raro é ela a explicadora que contratam para aplicar à prole os métodos que publicamente, entre os seus pares, proscrevem como antiquados.
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