foto: Bruno Espadana

18 abril 2006

#  Y, por supuesto, libre y digna

Voltando à Sábado da semana passada, o jornalista Ferreira Fernandes assina um interessante artigo de opinião (última página) sobre a visita dos monarcas espanhóis à Arábia Saudita, em que, contrariando a vontade do protocolo, a rainha espanhola recusou-se a cobrir a cabeça. O jornal El Mundo noticiou o acontecimento, informando que Doña Sofía ia, «por supuesto, descubierta». Diz Ferreira Fernandes:
[...] gostei, sobretudo, do “por supuesto” do jornal, ao dar como natural, como não podendo ser outra coisa, o arreganho da sua Rainha.

Instantâneos da visita da rainha de Espanha à Arábia Saudita
Infelizmente — é preciso dizê-lo —, a opinião não foi generalizada, havendo órgãos de informação espanhóis a apontar a Doña Sofía alguma falta de tacto diplomático. O articulista da Sábado não comunga de tais reservas, defendendo que há limites para as cedências e ilustrando oportunamente com o exemplo do
[...] ministro holandês que tendo convidado um colega iraniano para um almoço e tendo ouvido deste que não podia haver vinho na mesa, disse [...] que não havendo vinho, não havia almoço. [...] há coisas de que não podemos abdicar. Começamos por não dizer “tchim-tchim” e passamos o resto da vida a dizer “sim-sim”.

Voltando à visita real à Arábia, Ferreira Fernandes enquadra a atitude da rainha espanhola no cenário mais alargado da afirmação da dignidade feminina (os destaques são meus):
Desde pequena, [a mulher saudita] tinha sido ensinada que tinha de andar sempre resguardada porque senão os seus cabelos, a sua boca e o seu decote fariam os homens pecar. Ela tinha de penar a inexistência para que os outros não pecassem — assim mandava o Alcorão.
[...] de trás da abaia sinistra, eu vi uma cabecinha a pensar: “Queres ver que um dia posso apanhar sol nos joelhos?” Foi uma revolução do caraças o que Dona Sofia foi fazer para a península arábica. Dar a alguém vontade de apanhar sol nos joelhos é um passo enorme para a Humanidade. Tudo começou há alguns milhões de anos, quando homens e mulheres se tornaram erectos. Um dia, todos e todas estaremos assim.

Tirando o optimismo final, subscrevo tudo.

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