foto: Bruno Espadana

11 janeiro 2007

#  Ainda os traumas dos 14%

Voltemos à questão dos supostos 14% de traumatizadas entre as mulheres que abortam. Admitamos (for argument’s sake) que tal é verdade.

E então?

Por que razão os seus supostos efeitos traumatizantes hão-de ser argumento ao favor da criminalização ou da proibição do aborto?

Traumatizantes para algumas pessoas são a tropa, a ida para uma universidade distante, deixar a casa dos pais — mas isso não é argumento para se ilegalizar a tropa, as universidades ou o abandono do lar materno.
Traumatizante para muitas crianças é o primeiro dia de aulas — será por isso que vamos proibir a escola (ou, vá lá, condescender em que exista, mas decretar que comece pelo segundo dia)?
Traumatizante é, para muitos europeus do sul, a falta de luz nos países do norte da Europa — vamos, “para bem” dos mediterrânicos, ilegalizar a emigração para as latitudes acima dos 50º?


A existirem, os efeitos traumatizantes do aborto são, isso sim, argumentos a favor de aconselhar uma mulher a pensar bem quanto ao que ela quer fazer, considerar seriamente as alternativas que se lhe apresentam, certificar-se que mediu os prós e os contras da sua decisão (seja ela qual for). Estando consciente de que nunca se tem 100% de certeza a priori de que a opção feita (seja ela qual for) será a decisão “acertada” (admitindo que tal coisa existe).

Mas isso, claro, não se aplica só ao aborto. Aplica-se a todos os momentos da vida, a todos os actos e decisões de um ser pensante, dotado da autonomia (e do fardo) do livre arbítrio.

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