foto: Bruno Espadana

24 janeiro 2007

#  És «a favor da vida»?

Os movimentos apoiantes da criminalização do aborto (vulgo, «do Não») gostam de se apelidar de «movimentos a favor da vida, contra a morte». Falam como se alguém fosse abstracta, genérica e ontologicamente, «contra a vida».

(Parênteses: Admito entrar agora na especulação, mas não creio que mesmo os suicidas sejam «contra a vida» ou «a favor da morte», tout court. A sua decisão é pessoalíssima: terminar com a sua vida — não pretendem apontar a receita universal, urbi et orbi, muito menos impô-la aos outros.)

Na formulação globalizante (e, paradoxalmente, redutora) dos defensores do Não, ser «a favor da vida» tem tanto sentido como ser «a favor da morte»: ambas as coisas nada querem dizer. São expressões vazias, falaciosas, artifícios de retórica baixa. O seu uso recorrente por parte do campo do Não tem como único intuito atrair-nos para uma armadilha: o falso dilema entre a recta «defesa da vida» e a desviante apologia de uma «cultura de morte». Perante essas duas alternativas, quem terá coragem de não apoiar a primeira?
A questão é que a questão não é essa. À sua maneira, ambos os lados defendem a vida. A questão é que um lado põe os direitos de um projecto de ser humano, de um ser humano em potência (o feto) à frente dos direitos de um ser humano de facto (a mulher) — enquanto do outro se acha que, a ter de decidir entre uns e outros, prevalecem os direitos da ser humano de facto. Por mim, não tenho dúvidas em apoiar estes últimos.



Já agora, e socorrendo-me do Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea da Academia das Ciências de Lisboa:
vida [vídɐ]. s. f. (Do lat. vita). 1. Conjunto de fenómenos comuns aos animais e vegetais que contribuem para o seu desenvolvimento e conservação, constituindo o seu modo de actividade desde o nascimento até à morte. 2. Acção de existir, de viver. 3. Existência humana considerada em função do seu período de duração, desde o nascimento até à morte. [...]

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